Em um enunciado, estão conjugadas, na verdade, várias temáticas, cada uma merecedora de uma explicação própria. Assim, a resposta será dada em partes, de modo a atender a divisão temática dos itens da pergunta, assim como o encadeamento de ideias necessário a sua compreensão.
Direitos Fundamentais: Classificação e Eficácia das Normas Constitucionais
A questão da concretização dos direitos fundamentais, de sua efetividade e aplicabilidade deve ser analisada por dois enfoques diferentes, o da efetividade das normas constitucionais e o das garantias dos direitos fundamentais.
Por efetividade entende-se a concretização de uma determinada situação abstratamente prevista. A dos direitos fundamentais é exatamente a prática na realidade social do direito previsto em norma jurídica constitucional. Esta, como norma jurídica propriamente dita, é dotada de imperatividade e coercitividade.
Contudo, nem todos os dispositivos de uma Constituição estabelecem direitos fundamentais. Há normas de organização, há normas definidoras de diretrizes, enfim, normas várias em diversos graus de concretude e de aplicabilidade. Daí se extraem algumas distintas classificações das normas constitucionais:
a) normas de eficácia plena – correspondem às normas auto-aplicáveis do direito norte-americano. Normas constitucionais desta espécie têm em si todos os meios necessários para sua aplicação plena e imediata, sendo dispensável qualquer manifestação do legislador infraconstitucional para que seja viável a sua efetivação. São exemplos os artigos 5º, inc. LVII, e 120 da CF/1988.
b) normas de eficácia contida ou contível – embora sua aplicabilidade não seja condicionada a atividade legislativa ulterior, esta categoria de normas pode vir a ter sua eficácia restringida por normas outras, de acordo com o exercício de competência discricionária constitucionalmente fixada. Portanto, difere das normas aqui descritas na medida em que é passível de restrição pelo legislador infraconstitucional. São exemplos os artigos 5º, inc. XIII, 7º, inc. XXVII, e 14, §3º da Constituição.
c) normas de eficácia limitada – este grupo é subdividido em (c.1) declaratórias de princípios institutivos e (c.2) declaratórias de princípios programáticos. Sua eficácia e sua aplicação são condicionadas a atividade legislativa ulterior que lhe complete o conteúdo. As do primeiro subgrupo são as normas gerais de organização dos diversos órgãos e entes integrantes das estruturas dos poderes (p. ex., artigos 21, inc. IV, e 33, caput). As do segundo grupo, as normas programáticas, traçam programas e estabelecem princípios a informarem ou orientarem a atividade legislativa, executiva e jurisdicional. Por traduzirem elementos sócio-ideológicos da Constituição, têm caráter imperativo e vinculativo da atividade estatal, mas não se classificam como direitos subjetivos dos indivíduos (p. ex., artigos 192, §3º, revogado pela EC nº 40/2003, e arts. 227, §2º, e 241, da CF/1988).
Outra classificação é a elaborada por Luís Roberto Barroso: normas constitucionais de organização; normas constitucionais definidoras de direitos e normas constitucionais programáticas.
O primeiro grupo de normas disciplina a organização política do Estado, englobando questões estruturais e de competência, como forma de Estado, forma e sistema de governo, competências, atribuições e prerrogativas dos poderes, procedimentos de elaboração e aplicação de normas e fiscalização por órgãos integrantes das estruturas do Poder.
O segundo grupo de normas é o que estabelece os direitos fundamentais, divididos pelo Autor em direitos políticos, individuais, sociais e difusos. Sobre estas normas, escreve que: “[…] enquadram-se no esquema conceitual retratado acima, a saber: dever jurídico, violabilidade e pretensão. Delas resultam, portanto, para os seus beneficiários — os titulares do direito — situações jurídicas imediatamente desfrutáveis, a serem materializadas em prestações positivas ou negativas. Tais prestações são exigíveis do Estado ou de qualquer outro eventual destinatário da norma (dever jurídico) e, se não foram entregues espontaneamente (violação do direito), conferem ao titular do direito a possibilidade de postular-lhes o cumprimento (pretensão), inclusive e especialmente por meio de uma ação judicial”.
Enfim, são normas que atribuem direitos subjetivos, e, portanto, exigíveis por meio de tutela jurisdicional. Trata-se de categoria de normas que não se confunde com a de normas programáticas. Estas são as que estabelecem fins a serem perseguidos pelo Estado, sem, contudo, determinar as condutas pelas quais estes fins serão alcançados. Isto não significa que não produzam efeitos, pois levam à inconstitucionalidade de quaisquer normas anteriores (fenômeno da não recepção) ou posteriores com elas incompatíveis, orientam a interpretação das normas jurídicas e levam à proteção judicial contra atos que contrariem o preceito constitucional.
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