[ Há mais de 37 anos moro em uma residência doada a meu esposo pelo seu falecido patrão, na época pelo motivo de meu esposo ser funcionário mais velho e não termos casa própria. Meu esposo faleceu há 3 anos, realizamos junto a meus filhos algumas benfeitorias na residência, essenciais para moradia. Agora apareceu uma ex mulher do antigo patrão, pedindo a reintegração de posse, justificando que agora que meu esposo faleceu eu não tenho direito a morar na casa. A casa não tem documentos. (G. – Itapeva / SP) ]

O primeiro ponto a se destacar é a existência da doação. Não está relatado se essa doação foi formalizada. Veja-se o que dispõem os artigos do Código Civil a respeito:

“Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular.

Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.”

Uma doação de imóvel teria, necessariamente, que se fazer por escritura pública, na forma do art. 108, do Código Civil:

“Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.”

Se verbal a doação do imóvel, como tal não é válida. Sendo nula, não prescreve a ação para declaração de nulidade da doação, podendo ser alegada a qualquer tempo. Outro ponto é que pode ser que a doação tenha se dado sem a reserva de eventual meação devida à ex-mulher do doador, o que depende, contudo, de informações não disponibilizadas, como o regime de bens que vigorava entre o casal e a existência de partilha de bens quando da separação, ou divórcio.

Contudo, ainda diante da nulidade da doação, é possível ao possuidor (no que a cônjuge (você) se inclui), se atendidos os requisitos legais, pedir em juízo a declaração de usucapião do imóvel em questão, com base no art. 1238, do Código Civil:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Ou, conforme o caso, por aplicação da usucapião constitucional, se atendidos os seus requisitos, conforme o art. 183 da Constituição:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º – O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2º – Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º – Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Ressalte-se que é muito importante que havendo a ação de reintegração de posse que a senhora faça sua defesa, ou seja, “não deixe para lá”. Isso deve ser feito por um advogado particular de sua confiança, ou não havendo essa possibilidade, pela Defensoria Pública de sua cidade. Esse profissional (advogado ou defensor público) também deve lhe ajudar quanto à avaliação de eventual ação de usucapião a propor, e isso deve ser visto o mais rápido possível.

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